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O candidato à presidência do Brasil Eduardo Campos faleceu na manhã desta quarta (13) após o jatinho em que estava perder o contato com a torre de controle e cair em uma área residencial em Santos, litoral de São Paulo.
“Não se pode mais fazer política como se fazia no século passado”. Observado agora, o último post no Twitter sobre a última entrevista de Eduardo Campos (PSB) serve como uma espécie de prelúdio da carreira política do ex-governador de Pernambuco, morto nesta quarta-feira, 13 de agosto, em um acidente aéreo em Santos, no litoral paulista. Muitos dos eleitores o haviam conhecido na véspera, durante a aguardada entrevista ao Jornal Nacional.
Em sua curta campanha, Campos tentou exprimir, e assumir para si, o desafio de propor soluções novas para impasses que não são apenas do século passado, mas do retrasado. Impasses de um país que não decretou, na prática, o fim da escravidão nem das soluções autoritárias de regimes autoritários. Um país que negociou com o velho todas as saídas em direção ao novo.
Ao lado de Marina Silva, Campos se colocou como porta-voz dessa ansiedade, o que sempre foi para ele uma missão ingrata: como servir de ponte para o novo se o ponto de partida era o denominado “velho”? Filho e neto de políticos, ex-ministro de Lula e ex-aliado do governo contra o qual se rebelara, ele teria pouco mais de dois meses para dar aos eleitores, e talvez a ele mesmo, uma resposta convincente. Esse tempo, desgraçadamente, esgotou-se nesta manhã. Mas a questão, levantada em sua entrevista ao JN, segue em aberto: como fazer política hoje com tantas amarras nos séculos passados?
A morte do candidato dá contornos trágicos a uma campanha que parecia definida. É cedo, além de inadequado, fazer qualquer previsão política em um momento de luto e solidariedade, mas um ponto é possível destacar: sem ele na disputa, a campanha se empobrece. Candidatos, jornalistas, eleitores. Ficamos todos empobrecidos nesta manhã.
Em sua curta campanha, Campos tentou exprimir, e assumir para si, o desafio de propor soluções novas para impasses que não são apenas do século passado, mas do retrasado. Impasses de um país que não decretou, na prática, o fim da escravidão nem das soluções autoritárias de regimes autoritários. Um país que negociou com o velho todas as saídas em direção ao novo.
Ao lado de Marina Silva, Campos se colocou como porta-voz dessa ansiedade, o que sempre foi para ele uma missão ingrata: como servir de ponte para o novo se o ponto de partida era o denominado “velho”? Filho e neto de políticos, ex-ministro de Lula e ex-aliado do governo contra o qual se rebelara, ele teria pouco mais de dois meses para dar aos eleitores, e talvez a ele mesmo, uma resposta convincente. Esse tempo, desgraçadamente, esgotou-se nesta manhã. Mas a questão, levantada em sua entrevista ao JN, segue em aberto: como fazer política hoje com tantas amarras nos séculos passados?
A morte do candidato dá contornos trágicos a uma campanha que parecia definida. É cedo, além de inadequado, fazer qualquer previsão política em um momento de luto e solidariedade, mas um ponto é possível destacar: sem ele na disputa, a campanha se empobrece. Candidatos, jornalistas, eleitores. Ficamos todos empobrecidos nesta manhã.
O Nordeste não pode voltar ao esquecimento, pedia Eduardo Campos
No fim de 2011, acompanhei um ciclo de palestras, organizado pela revista CartaCapital, em Salvador, com o tema “O Nordeste do Século XXI”. Entre os palestrantes estava o então governador de Pernambuco, Eduardo Campos, morto na última quarta-feira, 13 de agosto, em um acidente aéreo.
O debate estava na ordem do dia. O Nordeste, havia anos, era a região que mais crescia no País. O otimismo era visível no discurso das autoridades presentes, como os governadores Jaques Wagner, da Bahia, e Cid Gomes, do Ceará.
Em certo momento, porém, entre um sorriso característico e outro, Eduardo Campos fez um alerta: é preciso cuidado para que o atual ciclo de desenvolvimento do Nordeste não seja somente mais entre tantos já vividos pela região e que foram insuficientes para extinguir as disparidades econômicas e sociais locais.
Segundo o pernambucano, embora os avanços fossem notórios – a venda de motos no Nordeste na região entre 2005 e 2010, por exemplo, havia crescido 266%, contra 185% da média nacional – existia um longo caminho a ser percorrido. Ele citou a inciativa de Juscelino Kubitschek de se unir a intelectuais nordestinos nos anos 1950 para institucionalizar o desenvolvimento da região. Como em outros momentos, lembrou Campos, o ciclo foi interrompido em seguida por falta de “qualidade”. “Na Bahia, houve investimentos econômicos, mas ficaram os desafios sociais, semelhantes aos de Pernambuco e outros lugares”, disse.
Campos defendia que apenas com a reabertura política, a partir de 1985, a desigualdade do Nordeste voltou a ser discutida como uma questão nacional. Mais de 20 anos depois, o cenário era animador, com o aumento da oferta de emprego, do salário mínimo e do poder de compra da população – graças, em parte, às leis de assistência social, aos programas de distribuição e transferência de renda, à expansão do crédito, sobretudo para a agricultura familiar e aos investimentos privados, puxados, sobretudo, pela Petrobras.
Segundo Campos, as mudanças após a redemocratização no País minaram a velha política dos coronéis e possibilitaram o acesso à informação da população e a sua mobilização em organizações sociais. “A gente se descolou dessas elites tradicionais que o tempo todo usou a máquina pública para permanecer no poder, e não para atender a população com políticas públicas. Na base do patrimonialismo e do fisiologismo, a exclusão social era motivo para se buscar migalhas, trocadas pelo voto de pessoas descrentes”, analisou. “Tudo o que as rapozonas gostavam era quando o povo desanimava. Tudo o que fizemos só foi possível porque o povo se animou. E ganhamos eleições impossíveis, improváveis.”
A exclusão, porém, era ainda (como ainda é) uma realidade. Junto com o crescimento econômico, o Nordeste passou a conviver com o aumento da violência e da criminalidade, associadas ao tráfico de drogas. Os índices de pobreza e da mortalidade infantil também são maiores no Nordeste do que na média nacional. Em 2010, dos 14 milhões de brasileiros com 15 anos ou mais que não sabiam ler nem escrever, 7,3 milhões viviam na região.
Para reverter esse quadro de vez, Campos pedia o fim da concentração de investimentos em regiões como o Sudeste, destino de 50% dos financiamentos do BNDES – entre 2008 e 2011, o índice obtido pelo Nordeste cresceu de 8% para 12%, índice avaliado por ele como “insuficiente”.
Segundo Campos, mesmo com o ritmo de desenvolvimento local, cerca de 1% superior à media do País, seriam necessários outros 50 anos para convergir o PIB per capta nordestino ao índice nacional. “Em um País onde boa parte do desenvolvimento industrial é puxada pelo setor automotivo, apenas duas montadoras foram instaladas na região em 60 anos.”
O combate às discrepâncias, defendia ele, passava pela união entre as lideranças políticas locais, o fim das velhas rixas, e a atenção às especificidades do Nordeste, “para que não repita apenas os modelos de desenvolvimento que um dia serviram para o Sul e o Sudeste”.
“Estamos tentando unir o Nordeste com bandeiras em comum. Ainda temos na memória o tempo em que tentávamos resolver nossos problemas com a guerra fiscal, enquanto a Europa fazia uma união de países em um mesmo bloco econômico.”
Um passo para corrigir as injustiças históricas, segundo ele, era a chegada das universidades ao Nordeste. Na outra ponta, ele citava como exemplo o fato de que, só em Pernambuco, 150 mil alunos passavam o dia nas escolas graças a um programa estadual de ensino integral. “Precisamos entender a questão nordestina como uma questão nacional. O Nordeste não é problema, o Nordeste é a solução”, disse.
Esse discurso fora resgatado e repetido muitas vezes por Campos quando se lançou candidato à Presidência. Com ele, o Nordeste saía daquele auditório onde acompanhei os debates, em Salvador, e ganhava o centro do debate nacional.
Dos candidatos com chances reais de vitória, Campos era o único com sotaque nordestino. Tinha como vice uma candidata do Acre, representante do Norte do País. Juntos, eles serviriam como um contraponto simbólico no debate com dois presidenciáveis mineiros (e seus vices paulistas) sobre as discrepâncias do desenvolvimento regional brasileiro, ainda afundado em consequências de acordos históricos que durante décadas operou na base do café com leite, na qual os candidatos de Minas e São Paulo se revezavam no poder conforme as conveniências.
Pois esse contrapeso simbólico acaba de perder a sua peça principal. A morte precoce do candidato pernambucano, aos 49 anos, não tira o Nordeste do centro das atenções – até porque é lá que a candidata à reeleição tem o seu eleitorado mais fiel. Mas sem ele a possibilidade de um embate real entre o que foi feito até agora para a região e o que poderia ser feito para avançar fica temporariamente adiada.
Em um país que durante anos olhou para o Nordeste como um “problema” – pior: fingiu que o “problema” do Nordeste não era deles – esta perda simbólica talvez represente o maior prejuízo político de uma tragédia de proporções incalculáveis.
O debate estava na ordem do dia. O Nordeste, havia anos, era a região que mais crescia no País. O otimismo era visível no discurso das autoridades presentes, como os governadores Jaques Wagner, da Bahia, e Cid Gomes, do Ceará.
Em certo momento, porém, entre um sorriso característico e outro, Eduardo Campos fez um alerta: é preciso cuidado para que o atual ciclo de desenvolvimento do Nordeste não seja somente mais entre tantos já vividos pela região e que foram insuficientes para extinguir as disparidades econômicas e sociais locais.
Segundo o pernambucano, embora os avanços fossem notórios – a venda de motos no Nordeste na região entre 2005 e 2010, por exemplo, havia crescido 266%, contra 185% da média nacional – existia um longo caminho a ser percorrido. Ele citou a inciativa de Juscelino Kubitschek de se unir a intelectuais nordestinos nos anos 1950 para institucionalizar o desenvolvimento da região. Como em outros momentos, lembrou Campos, o ciclo foi interrompido em seguida por falta de “qualidade”. “Na Bahia, houve investimentos econômicos, mas ficaram os desafios sociais, semelhantes aos de Pernambuco e outros lugares”, disse.
Campos defendia que apenas com a reabertura política, a partir de 1985, a desigualdade do Nordeste voltou a ser discutida como uma questão nacional. Mais de 20 anos depois, o cenário era animador, com o aumento da oferta de emprego, do salário mínimo e do poder de compra da população – graças, em parte, às leis de assistência social, aos programas de distribuição e transferência de renda, à expansão do crédito, sobretudo para a agricultura familiar e aos investimentos privados, puxados, sobretudo, pela Petrobras.
Segundo Campos, as mudanças após a redemocratização no País minaram a velha política dos coronéis e possibilitaram o acesso à informação da população e a sua mobilização em organizações sociais. “A gente se descolou dessas elites tradicionais que o tempo todo usou a máquina pública para permanecer no poder, e não para atender a população com políticas públicas. Na base do patrimonialismo e do fisiologismo, a exclusão social era motivo para se buscar migalhas, trocadas pelo voto de pessoas descrentes”, analisou. “Tudo o que as rapozonas gostavam era quando o povo desanimava. Tudo o que fizemos só foi possível porque o povo se animou. E ganhamos eleições impossíveis, improváveis.”
A exclusão, porém, era ainda (como ainda é) uma realidade. Junto com o crescimento econômico, o Nordeste passou a conviver com o aumento da violência e da criminalidade, associadas ao tráfico de drogas. Os índices de pobreza e da mortalidade infantil também são maiores no Nordeste do que na média nacional. Em 2010, dos 14 milhões de brasileiros com 15 anos ou mais que não sabiam ler nem escrever, 7,3 milhões viviam na região.
Para reverter esse quadro de vez, Campos pedia o fim da concentração de investimentos em regiões como o Sudeste, destino de 50% dos financiamentos do BNDES – entre 2008 e 2011, o índice obtido pelo Nordeste cresceu de 8% para 12%, índice avaliado por ele como “insuficiente”.
Segundo Campos, mesmo com o ritmo de desenvolvimento local, cerca de 1% superior à media do País, seriam necessários outros 50 anos para convergir o PIB per capta nordestino ao índice nacional. “Em um País onde boa parte do desenvolvimento industrial é puxada pelo setor automotivo, apenas duas montadoras foram instaladas na região em 60 anos.”
O combate às discrepâncias, defendia ele, passava pela união entre as lideranças políticas locais, o fim das velhas rixas, e a atenção às especificidades do Nordeste, “para que não repita apenas os modelos de desenvolvimento que um dia serviram para o Sul e o Sudeste”.
“Estamos tentando unir o Nordeste com bandeiras em comum. Ainda temos na memória o tempo em que tentávamos resolver nossos problemas com a guerra fiscal, enquanto a Europa fazia uma união de países em um mesmo bloco econômico.”
Um passo para corrigir as injustiças históricas, segundo ele, era a chegada das universidades ao Nordeste. Na outra ponta, ele citava como exemplo o fato de que, só em Pernambuco, 150 mil alunos passavam o dia nas escolas graças a um programa estadual de ensino integral. “Precisamos entender a questão nordestina como uma questão nacional. O Nordeste não é problema, o Nordeste é a solução”, disse.
Esse discurso fora resgatado e repetido muitas vezes por Campos quando se lançou candidato à Presidência. Com ele, o Nordeste saía daquele auditório onde acompanhei os debates, em Salvador, e ganhava o centro do debate nacional.
Dos candidatos com chances reais de vitória, Campos era o único com sotaque nordestino. Tinha como vice uma candidata do Acre, representante do Norte do País. Juntos, eles serviriam como um contraponto simbólico no debate com dois presidenciáveis mineiros (e seus vices paulistas) sobre as discrepâncias do desenvolvimento regional brasileiro, ainda afundado em consequências de acordos históricos que durante décadas operou na base do café com leite, na qual os candidatos de Minas e São Paulo se revezavam no poder conforme as conveniências.
Pois esse contrapeso simbólico acaba de perder a sua peça principal. A morte precoce do candidato pernambucano, aos 49 anos, não tira o Nordeste do centro das atenções – até porque é lá que a candidata à reeleição tem o seu eleitorado mais fiel. Mas sem ele a possibilidade de um embate real entre o que foi feito até agora para a região e o que poderia ser feito para avançar fica temporariamente adiada.
Em um país que durante anos olhou para o Nordeste como um “problema” – pior: fingiu que o “problema” do Nordeste não era deles – esta perda simbólica talvez represente o maior prejuízo político de uma tragédia de proporções incalculáveis.
Relembre a carreira do político Eduardo Campos
O candidato à presidência do Brasil Eduardo Campos faleceu na manhã desta quarta (13) após o jatinho em que estava perder o contato com a torre de controle e cair em uma área residencial em Santos, litoral de São Paulo. Leia mais!
1 - 5 / 20Juntos, Campos e Marina teriam a oportunidade de se colocar como alternativa a um embate político polarizado há 20 anos entre PT e PSDB. Era deles a missão de sacudir essa polaridade com os questionamentos certos. O debate era necessário, ainda que não apresentasse as respostas definitivas . Não era tarefa fácil. Ficou ainda mais difícil.
Apressados, analistas políticos se engalfinharão nos próximos dias para dizer que, passada a tristeza, a vida pedirá passagem, sem tempo para o luto ser absorvido. É possível. Marina Silva será a candidata. Politicamente, dirão que ela começa a campanha com um espólio de 20 milhões de votos obtidos por ela em 2010. A estratégia de transferência de votos foi encurtada pelo destino, dirão os especialistas. E caberá a ela ampliar esse espólio.
A análise faz sentido politicamente, mas na prática a teoria é outra. Todas as perguntas que se seguem a uma tragédia desta magnitude pertencem à dimensão humana, e não apenas política. Marina Silva será agora a candidata a presidente pelo PSB. Mas como? Com que rosto? Com que forças? Com que ânimo? Se há algo em comum nos cartazes e vídeos de campanha é o sorriso dos candidatos. Só que nunca, como agora, a alegria ficou tão fora do tom. Como fazer campanha, então?
Campos foi um governador popular, querido em Pernambuco e tinha tudo para conquistar uma fatia do eleitorado nacional. Tinha carisma, boas ideias e currículo. Basta lembrar que ele deixou como legado um Estado melhor do que aquele que recebeu. A comoção por sua morte fará dele uma figura simbólica a exemplo do avô, Miguel Arraes, cujo projeto político fora interrompido pelos militares após o golpe de 1964. O neto tinha como missão resgatar esse país interrompido. Morreu no mesmo dia da morte do avô.
Enquanto esteve em campanha, o slogan de Campos pedia mudanças. Mais precisamente, pedia coragem para mudar. Era uma arma política. Hoje virou um prelúdio. E um desafio a quem se propor, a partir de agora, a assumir, mais que um discurso, uma missão. Uma missão que, em suas últimas palavras, eram resumidas como o “sonho de um Brasil melhor”.
Fonte:https://br.noticias.yahoo.com/blogs/matheus-pichonelli/
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