O DENUNCISMO,AS PERGUNTAS EM ABERTO E AS HISTÓRIAS PELA METADE

O denuncismo, as perguntas em aberto e as histórias pela metade

A Veja
Que chama o senador Demóstenes Torres de “mosqueteiro da ética” – ele caiu por envolvimento com a máfia do jogo do bicho. Que mostra o pau, jamais a cobra, sobre os dólares cubanos para irrigar a campanha petista. Que coloca gays, cabras e espinafres na mesma frase. Que confunde lunáticos sociopatas com “trovões da razão” – e dá a eles espaço cativo para proferir ofensas sobre vítimas de tortura, cantar atriz assaltada e fazer loas ao justiçamento. Que escreve resenhas sobre biografias e é desmentida pelos próprios biógrafos. Que coloca branco em trajes servis para falar do mundo pós-PEC das Domésticas. Que pede ao leitor “soltar o seu inglês” às vésperas de sua editora adquirir uma rede de escolas…de inglês.

A Veja.
Quem a conhece sabe que está em campanha – e tem razões para desconfiar até quando ela diz que água molha. A campanha é antiga e remonta a disputas anteriores de mesmo enredo: o enredo novelesco de tensões eternas entre sombra e luz, bem e mal.
Quando em campanha, a semanal se permite fazer ilações mil sobre adversários com um empenho não observado quando os amigos se metem em encrencas. Eles, os amigos, também sabiam que o eleitor era enganado quando diziam não haver crise de água em São Paulo? Sabiam dos maços de dinheiro apreendidos com correligionários no meio da campanha? Sabiam que um presidente da legenda levara uma bolada para impedir investigações na Petrobras?
As dúvidas existem, mas tem lado – e precisam ser impressas a tempo de melar uma eleição já suficientemente lamentável e escalar os cães de guarda para repetir robotizadamente a palavra impeachment. Legalidade nos olhos dos outros é refresco.
O ambiente político gera desconfiança por onde se olhe, mas uma coisa é certa: um doleiro de relações multipartidárias interessado em reduzir a pena de uma condenação certa está disposto a dizer o que sabe. Diz saber, por exemplo, que Lula e Dilma sabiam dos desvios na Petrobras em benefício de aliados e, como se não soubessem, nada fizeram. Na época, um era presidente da República, a outra, ministra. É bom que se desconfie, mas é bom que se diga: ninguém, ao menos entre os eleitores, tem nada a perder se respostas exigidas pela declaração fossem respondidas. Uma delas é: o doleiro citou mesmo os dois petistas? O advogado do investigado não confirma nem desmente. Alega que o depoimento é sigiloso. Mas apurações de crédito maior indicam que sim, como mostrou reportagem de capa da Folha de S.Paulo. Desta primeira pergunta surgem outras, que podem ser esclarecidas antes, durante e depois da eleição de domingo – vença Dilma Rousseff, vença Aécio Neves, vença o papa:
- As suspeitas terão o mesmo tratamento a partir de segunda-feira?
- O doleiro terá mais ou menos crédito do que Roberto Jefferson, que disse com todas as letras ter alertado Lula sobre a compra de apoio parlamentar?
- Desta vez, quem alertou quem e como?
- Quem ganhou o que com a suposta omissão?
- Como o governo conseguiu acobertar o esquema quando era alvo de todas as lupas e holofotes após o escândalo do mensalão?
- Quem enriqueceu enquanto o esquema funcionou?
- Vão seguir o dinheiro?
- A lista de autoridades citadas será destrinchada?
- Saberemos dos conhecimentos de Francisco Dornelles, primo de Aécio Neves e ex-presidente do PP, o partido-pivô da acusação, ou este será apenas um detalhe?
- O que os supostos corruptores, no caso as grandes empreiteiras, têm a dizer?
- Em algum momento o sistema de financiamento empresarial de campanha, nascente da confusão entre público e privado na política, será colocado em xeque?
- Quem será formalmente denunciado e formalmente julgado?
Porque uma coisa é evitar as perguntas – e narrar ou desmentir as histórias conforme as afinidades. Outra é ampliar as perguntas, compreender o momento político, a crise de representação, a relação de interesses das partes envolvidas, inclusive de quem se dispõe a mergulhar na história só molhando os pés. A investigação profunda, sem oportunismo nem amarras do confronto entre candidatos sob orientações de marqueteiros, é tudo o que se espera a partir de agora. De golpismo, barrigadas e narrativas pela metade a nossa história está repleta.

Por Matheus Pichonelli

Fonte:https://br.noticias.yahoo.com/blogs/matheus-pichonelli/o-denuncismo-as-perguntas-em-aberto-e-as-historias-130155643.html



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